quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Carta de um prólogo de madrugada



Eu escrevo cartas...e enquanto existir neste transitório mundo: caneta, papel e sentimento; pretendo seguir escrevendo-as...Não existe tecnologia que consiga vencer a magia das cartas ... com a trajetória letra a letra no papel...e assim linha a linha, a emoção, as idéias, as narrativas; todas impressas não apenas no papel, mas sobre tudo no ato poético e onírico que é ter a capacidade de por sentimentos e idéias dentro de um envelope...
Melhor que o deleite de escrever uma carta é o prazer de receber uma...é a resposta ... É o ritual que esta pessoa se permitiu para lhe dizer algo ...Mesmo sabendo que o telefone está ali ao alcance da mão, o celular na bolsa e a internet diante de nossos olhos... a carta tem e sempre terá uma energia que não pode ser comparada a nenhum outro meio de comunicação ... ela é emoção e energia ... é comunhão, culto silencioso, pedaço de tempo dedicado... atenção!
Carta respondida é um pedaço de alma que se troca... O dom de trocar cartas é quase telepatia...
E embora esteja eu aqui fazendo apologia a este ato fascinante... não tenho praticado esta arte. Há quase um ano a pessoa que mais trocou cartas comigo nesta vida...foi para um lugar onde cartas não chegam ... e se chegam ...sou ainda incapaz de saber o endereço ...
Volta e meia pego, como que num hábito de muitos anos, a caneta e o papel para escrever-lhe algo sobre teatro, sobre o que estou criando, e anseio saber sua opinião ... Aí lembro que faz um ano que não tenho com quem dividir certos anseios...( e parecia que nos falávamos tão pouco...)Faz um ano que a segurança da resposta é impalpável no meu corriqueiro ato de escrever cartas...
E então me ponho a pensar o que ele me diria diante dos infinitos anseios que tenho tido a respeito da nossa arte e dos caminhos que já não sei se devo seguir... e dos tantos que vejo surgirem ...E é inevitável não sentir pulsar em meu peito a paixão pelo teatro que ele tanto fortaleceu em mim ...
Saber que a aprovação, a sugestão e as palavras não me chegam mais pelo correio me faz sentir um tanto quanto vazia... sei que ele não gostaria de ver o vazio que há em mim fruto desta ausência de resposta às minhas cartas...
Longe de mim querer tirar o seu sossego...
Eu sei que isso é um apego, mas neste prólogo de madrugada não temo esconder os sentimentos, defeitos, fraquezas... e em especial as saudades...ah as saudades...
Elas me aniquilam e me fortalecem numa mesma dose... e entender o que é saudade até para quem sabe o que ela é sempre é algo difícil ...por que cada um tem a sua forma de ter saudade... Bela palavra, praticamente intraduzível , seja para os outros idiomas ou para a ato de conceitua-la diante da imensidão que ela encerra...do infinito de sentimentos que ela coloca em ebulição em quem a sente...
E a minha saudade neste prólogo de madrugada é esta ...a de escrever cartas...a de receber cartas...
Ter a segurança que a carta que vai não é um tiro no escuro, não é ação sem reação...por mais que demore voltará...ainda que as palavras contidas nela fiquem aquém de nossas expectativas ...
Ah Paulo não foram só os palcos que você deixou vazio, deixou também a minha caixa de correios...e fez com que os envelopes, selos e canetas perdessem um pouco da sua significação...
Quanto a mim...me perco na vontade de encontrar significado a tantas e tantas coisas que parecem já não ter significados ...neste prólogo de madrugada de primavera chuvosa ...
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A imagem...saiu do seguinte lugar ...

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